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A IMAGEM IDEALIZADA E O IMPACTO NAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS

  • theilorprigol5
  • 15 de out. de 2020
  • 22 min de leitura


A IMAGEM IDEALIZADA E O IMPACTO NAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS

Joselisa Toigo 1

1 Joselisa Toigo – Graduada em Psicologia pela UCS/RS. Pós Graduada em Gestão de Pessoas com Coaching pela Monteiro Lobato/SP. Formações complementares: Advanced Master Coach Sênior/SP, Hipnose para Cura/RJ, Terapia de Vidas Passadas/RJ e Master Practitioner em PNL pela Society of NLP. Coautora do Livro: Os segredos do Coaching.

2 Célia Resende – Graduada em História da Arte pela ENBA/RJ. Formação complementar em Psicologia USU/RJ. Cartel Lacaniano/Paris, Univ. Vincennes. Psicologia Transpessoal e Dianética com Hugo e Magdalena Meachan/RJ, Hipnose Ericksoniana, Center Pointer, Houston TX. Filosofia e meditação Zen, Chung Tai Chen Monastery, Houston, TX.

Célia Resende 2

Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA

CELER FACULDADES

Curso de Especialização em Psicologia Transpessoal



RESUMO

Este artigo enfatiza a importância do autoconhecimento para a formação da autoimagem. A forma como o ser humano se percebe, as crenças que tem sobre si e os sentimentos com relação a essa imagem, são fatores determinantes na constituição da imagem que cria sobre si. As 3relações com as outras pessoas acontecem a partir das projeções e expectativas desse mundo interno, e acaba sendo determinante na qualidade ou afastamento dos relacionamentos. Através desta revisão bibliográfica foi possível identificar a existência de um eu real e um eu idealizado e o quanto a distância entre eles interfere na percepção realista de si. Na busca pela perfeição ilusória, parte do ser humano é negada, causando muito sofrimento e sentimentos de insuficiência. O objetivo é identificar a influência dessas imagens ideais nas relações interpessoais, já que estão diretamente ligadas a forma de como a pessoa vê a si mesma. As considerações nos remetem a reflexão sobre a responsabilidade individual pela busca da felicidade, maior consciência sobre a imagem de si e dos outros, e a autenticidade dos relacionamentos. Sem essa consciência, a relação consigo e com os outros se mantém ilusória e distante. A incapacidade de encontrar harmonia interior irá se projetar no mundo exterior gerando sofrimento pela expectativa de que o outro lhe faça feliz. Através do autoconhecimento é possível o reencontro com a essência, ou com o eu real, possibilitando o acesso a paz interior.


Palavras chave: Autoconhecimento. Imagem real. Imagem idealizada. Relacionamento interpessoal.


ABSTRAT

This article highlights the importance of the self-knowledge to the formation of the self-image. The way the human being sees himself/herself, the beliefs he/she has about himself/herself and the feelings related to this image, are determinants factors to the construction of the image that we create about ourselves. The relationships with other persons happen from the projections and expectations of this inner world and are important to determine the quality of the relationship or its removal. Through this literature review was possible to identify the existence of a real "I" and an idealized "I" and how the distance between them interfere in the realistic perception of himself/herself. On the search for the illusory perfection, a part of the human being is denied, causing by that suffering and feelings of insufficiency. The objective is to identify the influence of these ideal images in the interpersonal relationships as they are directly linked to the way the people see themselves. These considerations bring us to reflect on our own responsibility for the search for happiness, for the consciousness about the image of ourselves and the others and also for the authenticity of there relationships. Without this consciousness, the relationship with yourself and with the others remains illusory and distant. The incapacity to find inner harmony will be taken to the outside world generating suffering by the expectation that the other will make you happy. Through the self-knowledge is possible to recover with the essence, or with the real "I", making possible to access to the inner peace.

Keywords: Self-knowledge. Real image. Idealized image. Interpersonal relatioship.



INTRODUÇÃO


As pessoas que buscam o caminho do autoconhecimento se deparam com muitas perguntas sem respostas. A dúvida, o medo e a insegurança fazem parte desse processo já que existe uma resistência interna muito grande em revelar quem realmente são, sem as máscaras e ilusões. Passam por um processo de luto do eu ideal, do egoísmo, das necessidades de aprovação, ou seja, a morte se faz necessária para um posterior renascimento. Não se trata de um processo fácil, pois exige ampliação da consciência, responsabilidade sobre as escolhas, determinação, disciplina e persistência. Para os que suportam passar pela barreira do medo e da dor, o processo é libertador. Somente após essa maturidade individual é que se tornam capazes de se relacionarem de forma verdadeira e amorosa, pois não existe a possibilidade de aceitar e amar o outro sem antes fazer o mesmo consigo.


Qual a origem de quem eu sou? Porque meu comportamento se repete mesmo eu não querendo? Porque as pessoas são tão diferentes umas das outras, com crenças e valores únicos? Onde tudo isso inicia? Essas perguntas constantemente perambulam pelas cabeças na busca por uma solução dos problemas diários, ou quando as pessoas se sentem insatisfeitas consigo e com as pessoas que as cercam. Olham para si mesmas e não encontram respostas ou saídas para se libertarem dos ciclos repetitivos de sofrimento. Permanecem na busca constante de desvendarem o mistério de quem verdadeiramente são por trás de tantas nuvens.


O ser humano parece estar cada vez mais distante de si mesmo e das pessoas de quem ama. Esse distanciamento acaba gerando sofrimento, insatisfação e sentimento de vazio. Levando isso em consideração, este artigo busca por alguns caminhos que levam a esta compreensão, a fim de desenvolver seres humanos mais livres e conscientes de si mesmos e de suas escolhas, e manterem relacionamentos mais harmônicos e felizes. O objetivo é tornar mais consciente a importância do autoconhecimento na formação da imagem que cada um tem de si e dos outros, e a influência dessas imagens nos relacionamentos interpessoais.


A partir de uma pesquisa com abordagem bibliográfica, buscou-se na literatura respostas sobre como lidar com a dicotomia entre a imagem real e a imagem idealizada e suas interferências no desenvolvimento humano. Além disso, a pesquisa também considera a forma como essas imagens criadas interferem na qualidade ou no distanciamento dos relacionamentos.


Assim sendo, este estudo aborda o autoconhecimento, mais precisamente a forma de ver a si e as pessoas a sua volta, e leva a uma reflexão sobre as possibilidades de viver em harmonia consigo e com os outros.



ONDE TUDO COMEÇOU

Qual o momento em que passamos a existir? Provavelmente bem antes do que se possa imaginar. Todos, de alguma forma, já existiam nas fantasias infantis de seus pais, quando a mamãe brincava de boneca, ela imaginava como seria seu filhinho, ou seja, ali nascia o primeiro esboço do filho ideal!


Antes mesmo da mulher engravidar seu bebê já estava sendo gestado, seja nos seus desejos, sonhos, fantasias inconscientes e conscientes. Estas representações vão se formando a partir de sua história de vida, relações interpessoais, vivências, expectativas em relação ao futuro, entre outras. Para uma melhor compreensão sobre esta pré-história do bebê, é pertinente investigar o que os estudiosos da gravidez referem.


Caron (2000) dá o nome de “influências ambientais” a essas construções da mulher, que existem desde a concepção do feto, e se revelam através da história passada da mãe, seus desejos, suas fantasias inconscientes, seus conflitos transgeracionais e o lugar destinado a este bebê.


Dessa forma, há de se considerar as experiências e registros infantis da mãe para a formação da imagem do bebê (Brazelton e Cramer, 1992; Klaus e Kennell, 1992). Essas experiências passadas são determinantes para moldar o seu papel de “cuidadora,” já que as crianças usam os adultos como modelo de identificação para seu próprio comportamento. Então, bem antes de uma mulher tornar-se mãe, ela aprendeu através da observação, do brinquedo e da prática um repertório de comportamentos maternos. Aprendeu como pegar e tocar no bebê, quais as características físicas e psicológicas ideais para ele, e esses registros tornam-se imperativos inquestionáveis para ela durante toda a vida, influenciando diretamente na sua relação com o futuro bebê. Stern (1997) complementa a ideia, afirmando que no brincar de boneca, a menina manifesta o seu desejo de ser mãe. Brincando, ela cria uma ideia de mãe (tal como a representa) e uma ideia de filha (tal como se representa como filha).


Assim, a imagem do bebê idealizado é constituída de todos os processos vivenciados pela mãe, desde suas expectativas enquanto criança, até as representações construídas a partir das crises passadas durante o período gestacional. É moldado e remoldado a cada nova experiência física e emocional da mãe. “Esta montagem narcísica lhe oferece a ilusão de satisfazer, através desse outro, que ao mesmo tempo é ela mesma, as frustrações impostas pela vida.” (Ferrari, Piccinini e Lopes, 2007, p. 310).


O bebê já nasce com a missão de fazer uma história conforme os desejos, sonhos, faltas e fantasias da mãe. Essas representações vão dando uma identidade ao bebê durante a gestação, “(...) é como se ‘encontrar’ com o bebê antes de seu nascimento.” (Piccinini et al., 2004, p. 229). No entanto, esta imagem que a mãe constrói sobre o filho se sobrepõe a sua imagem real (Moura, 1986). Isso porque este filho imaginário surge no espaço criado entre o que já é conhecido e o desconhecido (Grigoletti, 2005). Stern (1997) complementa esta ideia quando contrapõe duas visões, a de um mundo externo, real, objetivo, e um mundo mental, das representações imaginárias e subjetivas.


Segundo Maldonado (2002) o bebê se constitui num enigma que pode representar esperança de autorrealização para os pais ou uma ameaça de expor as suas dificuldades ou deficiências. Resende (2012) complementa confirmando que os pais projetam cada qual suas fantasias sobre o filho, e essa idealização revela as frustrações que cada um deles carrega assim 5 como padrões de comportamento e crenças, e ressalta que estes, formam conteúdos inconscientes que passam de uma geração a outra.


Alguns autores que se dedicaram a estudar a relação mãe-bebê e a formação do vínculo e do apego constataram que está diretamente relacionado a essa idealização do bebê, e é a partir dela que emergem as relações posteriores da criança (Bowlby, 1989; Kalus e Kennell, 1992; Maldonado, 2002; Spitz, 1996; Stern, 1997; Winnicott, 1978).


Diante de todas estas constatações, é possível concluir que as expectativas dos pais diante do bebê que vai nascer não são nada modestas, e surpreende que, antes mesmo da criança vir ao mundo já existia uma pré modelagem de como ela deveria ser, como deveria agir, pensar, sentir, entre outros aspectos que se aproximam do ideal de filho. A questão a ser refletida é: como o bebê, quando nasce, reage a esse mundo de expectativas sobre ele?



NASCIMENTO DO EU IDEAL

O vínculo dos pais com seus filhos é considerado, por Klaus e Kennell (1992), um relacionamento único e o mais forte de todos os laços humanos. Winnicott (1978) já afirmava: “um bebê é algo que não existe, querendo dizer, naturalmente, que sempre que encontramos um bebê, encontramos a maternagem, e que, sem a maternagem, não existiria bebê algum” (p. 42). Isso porque o bebê é totalmente dependente de sua mãe ou de alguém que lhe satisfaça as suas necessidades físicas e emocionais. A intensidade do envolvimento afetivo dedicado a este bebê, pode ser determinante para que ele sobreviva e se desenvolva, já que é de importância vital para o bebê, sentir-se amado e desejado. E na falta deste envolvimento afetivo, ele poderá ter várias consequências na vida psíquica, inclusive pela própria imaturidade do corpo humano quando nasce (Klaus e Kennell, 1992; Souza, 2005; Spitz, 1996).


Por isso, se o vínculo materno-fetal não for consolidado durante a gestação, faz-se necessário restabelecê-lo nos primeiros momentos após o nascimento, já que qualidade deste vínculo influenciará sobre todos os futuros vínculos que serão estabelecidos com as outras pessoas. É somente a partir de um vínculo satisfatório, que a criança desenvolverá sentimento de autoconfiança, confiança no mundo e nas pessoas (Winnicott, 1978).


Diante disso, retorna a questão sobre como o bebê vai reagir diante das expectativas sobre ele. Surpreendentemente ele fará tudo o que for possível para atender as esperanças do meio externo, visto que possui uma necessidade de sobrevivência de ser amado. Desde muito cedo o ser humano é condicionado a um modelo ideal, que atenda as necessidades dos outros. Nesse processo de busca pelo reconhecimento, admiração e amor do outro, citado com maestria 6 pelo Dr. Costardi (1997), ele enfatiza o quanto as pessoas abrem mão do seu eu real para atender às necessidades dos outros em troca dessa aprovação.


Moss (2008) complementa afirmando:


Quando crianças, somos como copos de fino cristal, que vibram com a voz de um canto. Reproduzimos a energia emocional que nos cerca, incapazes de ter certeza da parte que somos nós - de nossos verdadeiros sentimentos e gostos ou ojerizas – e da parte que são os outros. Somos observadores argutos do comportamento de nossos pais e de outros adultos em relação a nós e entre si (p. 16).


Considerando o período da infância, torna-se mais fácil compreender a relevância em suprir essas necessidades de ser amado, admirado e reconhecido, e o porquê da criança se condicionar às necessidades dos outros. No entanto, o que surpreende, é o porque manter esse padrão de necessidades na vida adulta. Thesenga (1997) contribui afirmando que a falta de consciência e o medo do eu imperfeito faz com as pessoas criem as máscaras de um eu idealizado, baseado no eu que pensam que deveriam ser, em vez de admitir que são seres humanos imperfeitos. Essas necessidades os mantém repetindo esses padrões pela vida toda, e os deixa aprisionados no passado, em ciclos de repetição.



A NEGAÇÃO DO EU REAL

Por toda vida foi comum ouvir julgamentos de como deveria ser uma pessoa “correta”, o que seria mais sensato pensar, agir e sentir, a partir de um padrão de normas sociais que modelam as pessoas desde o nascimento. São os “tem que” da vida! Você tem que ser um filho exemplar, tem que ser um excelente aluno, tem que escolher uma profissão que lhe dê poder, tem que casar e ter filhos, tem que ter um corpo perfeito, tem que ter muito sucesso profissional, tem que, tem que, tem que ....


Porém nesse script dos “tem que” não consta a palavra felicidade, mas sim, são crenças sociais que dão a impressão de seguir o fluxo certo, mesmo que isso não faça sentido algum. Quem segue este caminho tem a sensação de controle, aprovação, pertencimento e de certa forma de conforto, já que não precisa fazer escolhas, pois apenas segue um fluxo predeterminado.


É possível perceber um número expressivo de famílias desestruturadas, pois os pais não pensaram se realmente queriam ter um filho, simplesmente o tiveram porque “tinha que” ter. Quanto a esse fluxo dos “tem que” é imprescindível questionar sobre as escolhas realmente conscientes da vida, para que façam sentido no fundo do coração, integrando corpo, mente e 7 espírito. Não é por nada que existem tantas crianças órfãs de pais vivos, tantos profissionais bem-sucedidos e infelizes, tantos casamentos dissociados de amor.


Desde cedo as críticas são muito mais comuns aos elogios e incentivos. As pessoas não são incentivadas a darem o melhor de si e sim apontadas por aquilo que não são, gerando dentro de si a “síndrome da insuficiência”, por acharem que nunca serão boas o suficiente. Para Moss (2008), essa sensação de insuficiência ou percepção de que algo está errado consigo, prejudica a capacidade de se relacionar com as próprias sensações, sentimentos e pensamentos, ao mesmo tempo que altera a maneira de perceber o ambiente externo e o mundo.


Para Resende (2011), esses valores sociais distorcidos são a causa mais comum que afetam a autoestima e a autoconfiança das pessoas:


... Não existe virtude sem defeito; entretanto, está cada vez mais difícil encontrar espaço para a imperfeição, com a expressão da individualidade reduzida a apenas dois aspectos: vencedores e derrotados. Não há lugar para aqueles que apresentam características fora do padrão de liderança ou não tenham ambição para os grandes desafios. Fora do modelo pré-determinado de assertividade, haverá pouca chance para alguém encontrar seu lugar. Provavelmente estará fadado a engrossar as fileiras do clube dos derrotados (p. 9).


Além disso, complementa afirmando que, diante desses valores, não é permitido qualquer tipo de fraqueza, medo, dúvida ou sofrimento. Aos que não se enquadram restam sentimentos de desvalorização, desclassificação e exclusão. “Aos desafinados, sonhadores, pouco práticos, aqueles que perdem o compasso e pisam a pé na contrabalança, resta o limbo” (p.10).


Desde muito cedo a criança aprende a negar a sua imagem real, quando na busca incessante pelo amor dos pais tenta ser a perfeição dos seus sonhos. Não cabem nestes requisitos, sentimentos ruins, como raiva, inveja, ciúmes, ódio, medo, dor. O filho perfeito tem que ser excelente em tudo! É treinado a reprimir esses sentimentos e não orientados a lidar com eles.


“Fomos condicionados a temer o lado obscuro da vida, assim como o nosso” (Chopra, Ford e Williamson, 2010, p.5). Para estes autores, os seres humanos são dualistas, feitos de forças opostas. Da mesma forma que, se o Universo não tivesse as forças criativas se opondo simultaneamente ao declínio, ou entropia, não haveria universo, os seres humanos também só são completos a partir dessa dualidade, pois essa é a natureza humana. E orientam que se as pessoas ignorarem ou reprimirem esse lado sombrio, apenas estarão intensificando seu poder, e negá-lo os conduzirá a mais sofrimento, dor, tristeza e sujeição. Quanto mais as pessoas 8 estiverem alertas e presentes, mais perceberão o quanto são robóticas e encurralados nas personalidades que criam.


O maior desejo do ser humano é ser aceito pelo que ele é! E passa uma vida buscando por isso nos outros, quando na verdade, ele mesmo não se aceita humano e brinca de ser Deus. Quando o homem aprender a se amar como ele é e aceitar sua dualidade como completude, ele mesmo irá se aprovar, se reconhecer, se admirar, e assim deixará de ser uma criança desesperada e mendiga de afetos, lutando pela aprovação dos outros.


Resende (2011) faz uma alusão pertinente de Jesus, quando cita o que ele disse: “amar aos outros como a si mesmo”, em que ele parecia dizer: seja tolerante com sua condição humana e faça o mesmo com os outros. E acrescenta dizendo que o amor é a energia que integra e unifica, e que por isso, devemos amar integralmente, com as qualidades e defeitos, como exercício de tolerância para si mesmo e aos outros. “O caminho da felicidade está na auto aceitação e na coragem de se revelar humano com todas as qualidades e defeitos” (p. 122).


Quanto maior a distância entre o eu real e o eu ideal, maior será o sofrimento. Imagine o quanto de energia será gasta para convencer os outros e a si mesmo sobre aquilo que não é, mas que se pensa ser, ou gostaria de ser. Mais longe estará da sua essência! Seria tão mais simples se aceitar humano. Talvez perceberia o quanto já é grandioso pelo simples fato de ser único!


O Dr. Ênio Burgos ( 2015) fala sobre a imagem diante do espelho, e dos sentimentos de dor que diante da verdade, mas sabiamente refere a isso dizendo que quando a pessoa encontra a verdade se livra das mentiras, artimanhas, dissimulações que consomem o seu ser. “Após a verdade, nossos ombros se aliviam e se reerguem naturalmente, e nós descobrimos a maravilha de respirar sem contrição. A verdade nos liberta das ilusões” (p. 55).


O ativismo quântico ensina que tudo o que existe no Universo precisou ser desejado (Goswami, 2015). Dessa forma, se pensar, que cada ser humano, na sua unidade, precisou ser desejado por algo maior, isso por si já é incrivelmente maravilhoso! Se perceber que a unidade está para a totalidade, e que essa totalidade só existe se cada um estiver ali, caso contrário não será o todo! Como que diante disso pode existir o sentimento de insuficiência? Tudo é perfeito como é! Talvez seja possível perceber que o Universo todo está em evolução, na mesma direção, e que todos chegarão lá juntos, e quem sabe assim, os homens abram mão das necessidades egóicas e comecem a pensar na evolução como um todo (Costardi, 1997a).


Pozzati (2007), fala sobre a inteireza do ser com muita sabedoria, e afirma que os seres humanos e tudo mais que existe são campos de informação que se conectam entre si, num grande campo, na Totalidade. Também lembra que ao mesmo tempo que o ser humano é um 9 ser individualizado, também está conectado, sendo assim, suas intenções, conectadas a este campo, se amplificam, influenciam e são influenciadas pelo campo maior. E faz pensar que se aprender a vibrar de forma coerente com o restante do Universo entrará em harmonia com o mesmo e poderá, coletivamente influenciar na busca pela paz.



RELACIONAMENTOS INTERPESSOAIS


Falar em relacionamento interpessoal fica mais claro depois de aprender a se relacionar consigo mesmo, equilibrando sua imagem real e imaginária. Isso porque também vai se relacionar com essas imagens, nas relações com os outros. Costardi, nas suas aulas sobre “Os caminhos da evolução do ser” (1997b), abordava esse tema com maestria, por isso seus estudos serão referenciados na reflexão desse tema. Ele faz uma análise sobre a imagem criada dos outros a partir dos papéis com os quais se relaciona. Segundo ele, geralmente as pessoas depositam nos outros um compromisso de serem aquilo que gostariam que elas fossem, que por sua vez, está muito distante daquilo que elas realmente são.


Talvez seja interessante iniciar um questionamento sobre quem realmente o ser humano ama nas suas relações, o Eu real ou o Eu imaginário do outro? Em uma relação entre duas pessoas que estão enamorando, por exemplo, e que se conheceram a pouco tempo, ela leva para a relação seu Eu ideal, porque obviamente só deseja revelar o melhor de si, e ele também leva seu Eu ideal. No entanto nem ele e nem ela vai realmente se encontrar, visto que, quando marcaram o encontro ele e ela já criaram dentro de si um ideal sobre o outro. São quatro personagens em ação e mais dois disfarçados: o meu eu real e o meu eu ideal, e o eu ideal que eu crio do outro, isso para cada um. Percebemos dessa forma, que a verdade fica bem encoberta.


A partir dos seus ensinamentos, Costardi (1997b) dizia que as pessoas buscam um príncipe encantado no outro, justamente para que ele o confirme princesa! Só que na realidade, o que encontram são sapinhos, e por isso, passam uma vida toda tentando transformar o sapinho em príncipe, dizendo e cobrando como ele ou ela deveria ser, pensar, agir... Por isso retorna a pergunta: quem realmente o ser humano ama? A pessoa real que está com ele ou aquela à qual idealiza? Será que já enxergou essa pessoa verdadeiramente como ela é e a amou exatamente assim, humana?


Se aceitar sua própria condição humana, é muito provável que aceitará a condição humana do outro, e dessa forma, viverá um processo lindo de crescimento um ao lado do outro, um espelhando o outro, amorosamente. Não existe evolução sem amor, aceitação e relacionamento.


Uma das coisas que mais compromete negativamente os relacionamentos interpessoais, considerando esse tema abordado, são os papéis aos quais são representados (Costardi, 1997b) O papel de pai, mãe, esposa, filho, professora, administrador, psicólogo, etc. Quando as pessoas se relacionam através dos papéis, a relação se distancia ainda mais do real e da pessoa. Passam a se relacionar através das expectativas que criam sobre esses papéis ideais e não com a pessoa em si.


Imagina o papel do pai. Quando fala em pai, esse, vem carregado de um ideal muito forte, cheio de crenças e esperanças sobre como deveria ser um verdadeiro pai. Cria-se essas expectativas baseadas, provavelmente no pai dos outros, ou a partir das necessidades do eu ideal. E é justamente por esse pai do outro que se sofre, por esse pai idealizado, e não pelo pai real. Aquilo que falta é o que faz sofrer, ou seja, se passa uma vida sofrendo pelos pais que não se tem. Na verdade, deveria colocar no lixo esses papéis de pai e mãe ideal, e olhar para a mulher e o homem por trás desses papéis.


Se carregar dentro de si um pai que tem muito mais de herói do que de homem e tem que conviver diariamente com um pai que é bem mais homem que herói, imagine só o conflito que terá internamente. Cobra, cria expectativas, exige posicionamentos, sempre querendo dirigir o comportamento desse homem para que ele se transforme naquele herói que idealizou, mas que na realidade não tem compromisso nenhum com o seu projeto ideal de pai, ele é um homem, ele tem compromisso com o crescimento dele, com a forma de ele sentir e pensar. Não pode cobrar, criar expectativas de que ele venha a oferecer coisas que não lhe pertence ou que ele não pode dar. Quem será que sacaneia a relação, cobrando posicionamentos e atitudes heroicas? Pedindo e exigindo que ele aja conforme os mitos que criou a respeito do que é a imagem do pai?


Quem sabe está na hora de refletir sobre como está vendo, pensando e sentindo totalmente distorcido da verdade. Ora colocando afeto demais, expectativas demais e sofrendo, ora colocando de menos e cabe ali a indiferença afetiva.


Em relação ao papel de mãe e o jogo entre as relações de mãe e filhas:


Mãe tem sempre a obrigação de ser sempre forte ou então de serem doentes... não existe mãe normal! Ou ela é controladora ou é a vítima. A mulher não, ora ela tem o direito de estar bem, ora de estar mal, ela tem liberdade... fala de mulher para mulher com a mulher que é sua filha (Costardi, 2002, p. 9).


Costardi alerta que sem perceber, as filhas poderão estar ignorando qualquer forma de expressão afetiva para essas mulheres especiais com as quais convive tanto tempo, sem as 11 considerá-las verdadeiramente, e no entanto, representam formas fantásticas e ritualizadas de expressar afetos por alguma coisa que chamam de mãe. Guardam para com o nome mãe muito afeto, mas não em si a própria pessoa. E as vezes, aquela que é a própria, não é dispensado a ela, nenhum sentimento.


Quantas pessoas tem realmente consciência de que sua mãe é uma mulher. Quantas já chegaram a olhá-la como mulher? Com tudo que uma mulher tem e lhe é pertinente, como: desejos, fantasias, sonhos, fracassos, com a busca de uma vida melhor para todos? Mas o papel é uma coisa, não é ela, não é a pessoa dela.


Se tomar consciência que por trás daquele homem e daquela mulher existe um ser humano, também em evolução, com sentimentos, desejos, medos, inseguranças, insuficiência, carência, será que as relações seriam tão sofridas? O triste de tudo isso é que talvez passam uma vida sem nunca ter olhado para o eu real deles, para quem eles verdadeiramente são. Obviamente que serão bem menores que o eu ideal projetado, pois são humanos. Mas talvez possa aceitá-los na sua simplicidade de ser, e a relação possa ser mais genuína, mais simples.


Talvez possa compreender que se eles não lhes deram tudo aquilo que pensou merecer, é porque eles não aprenderam a dar simplesmente porque também não receberam. E que o melhor que puderam fazer foi lhe dar a vida, o alimento, o lar. E também possa considerar a época em que nasceram, o estudo que receberam, as informações que tiveram acesso e o afeto recebido, que os tornaram assim, do jeitinho que eles são. E quem sabe, aprenda a valorizar mais um café da tarde feito com carinho pela mãe, numa tarde de inverno, e a ame por isso!


É necessário colocar no lixo os papéis, e se relacionar com o ser humano por trás dos papéis. Olhar para os filhos e enxergar um homem ou uma mulher e o respeitar como tal, com suas particularidades, com seus desejos, com seus valores, com seu livre arbítrio. Aceitar eles exatamente como são, sem querer o tempo todo transformá-los em réplicas, para que também confirmem uma imagem de pai e mãe perfeitos.


Nos relacionamentos íntimos, também se faz necessário olhar para a mulher ou homem e deixar de lado o papel de esposa e marido. Esses são chatos, depois que casam, querem comandar, dizer como o outro deve ser o tempo todo, são possessivos. Seja mulher, essa é mais romântica, sedutora, apaixonada, cuidadora. Seja homem, amante, companheiro, livre, esse é mais atraente, desejado, apaixonante. Permita que os companheiros se sintam importantes, simplesmente assim como eles são, e estes nunca se afastarão.


O ser humano estuda tanta coisa nesta vida, passa anos no colégio e universidades estudando números, línguas, física, economia, e pouco estuda sobre relacionamentos. Todos são seres sociais e não sobrevivem isoladamente, e nem isso os faz estudar sobre como se relacionar, sobre as diferenças entre as pessoas, sobre comunicação! Se houvesse maior dedicação a isso identificaria que, para atrair pessoas é preciso aceitar elas a partir do mundo delas e não do seu. Saberia que é fundamental dar um espaço para o outro existir ao seu lado, e não tentaria ocupar todos os espaços, o tempo todo. Aprenderia a dar um passo para trás na sua verdade, no egoísmo, para que o outro tenha a verdade dele, para que pense do seu jeito, sinta da sua maneira e viva a partir de seus valores, já que todos temos livre arbítrio (Carnegie, 2012).


O outro só existirá nas relações se o fizer se sentir importante, valorizado e reconhecido. Caso contrário sempre será sempre só o eu. Talvez devesse aprender a deixar o outro falar de si mesmo, escutar e crescer com sua história e não querer falar só de si o tempo todo. Aprender a dar ao outro exatamente aquilo que gostaria de receber e o mesmo retornará.

Lapidar o amor dentro de si! Esse é o maior desafio enquanto humanos, aprender a amar verdadeiramente. Então é necessário treinar diariamente, a todo instante, pois não há evolução sem o amor. Aprender a se perdoar, pois o erro sempre existirá, assim também, estará apto a aprender a perdoar o outros. Eles também erram. A humanidade só evoluirá quando o último ser humano evoluir, então, não adianta chegar na frente, sozinho. Faça por si, mas faça também pelo todo.


“Sem uma mente conectada com o fluxo maior ligado à totalidade, sem uma mente em harmonia (interna ou externamente) com todas as coisas e seres, não chegaremos a lugar algum, muito menos ao nosso tão sonhado destino final: a sanidade”. (Burgos, 2015, p.118)



CONSIDERAÇÕES FINAIS

O autoconhecimento possibilita um encontro verdadeiro consigo mesmo. Ele é um canal revelador que permite tomar consciência dos próprios pensamentos, sentimentos e comportamentos. Autoriza desmascarar o eu idealizado e liberta dos condicionamentos e expectativas fantasiosas do meio externo. Através desse acesso é possível perceber o quanto distante se está da realidade, o quanto a essência está abandonada ou renegada, não somente a própria mas das pessoas que se ama, e tudo em nome de um papel ou de um ideal.


A descoberta do eu real é o encontro da unidade com a totalidade, em que jamais existe o sentimento de insuficiência. É a aceitação da condição humana, da dualidade e é o caminho que leva a paz e a felicidade. Como Thesenga (1997) diz, fortalecer a capacidade de aceitar e perdoar a si mesmo e não se julgar, se rejeitar ou ficar se comparando com os outros, também fortalecerá a capacidade de amar as pessoas. Para ela, o homem só aprenderá a amar incondicionalmente os outros, sem cegueira, complacência nem dependência, unicamente depois de ser capazes de amar a si mesmo. Isso porque enquanto estiver cego, projetando seu 13 eu idealizado, vai precisar continuar a imaginar relacionamentos ideais. Moss (2008) conclui dizendo que “o grau de proximidade ou de distância de nosso verdadeiro eu determina a qualidade dos relacionamentos que criamos” (p. 12).


Espero que este estudo atenda o objetivo de conscientizar as pessoas sobre a importância do autoconhecimento, e principalmente da interferência de sua imagem na qualidade de vida e proximidade das relações interpessoais. A mudança e o crescimento ocorrem quando estamos dispostos e abertos para a verdade sobre nós mesmos. Muito ainda temos a investigar sobre os relacionamentos e nossas projeções pessoais sobre eles. Serão necessárias muitas pesquisas sobre esse tema para ampliarmos a cada dia a consciência sobre nós mesmos.


“Qualquer que seja a direção que você tome

a agulha da bússola sempre aponta para o Norte.

O mesmo deveria ser com você.

O que quer que você faça e onde quer que você vá,

deixe que sua mente permaneça em seu coração.” Mooji (2009, p.4)




REFERÊNCIAS




BOWLBY, John. Uma Base Segura: Aplicações clínicas da teoria do apego. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

BRAZELTON, T. Berry. e CRAMER, Bertrand G. As Primeiras Relações. São Paulo: Martins Fontes. 1992.

BURGOS, Enio. Medicina Interior: A medicina do coração e da mente. 4.ed. rev. e ampl. São Francisco de Paula/RS: Bodigaya, 2015.

CARNEGIE, Dale. Como Fazer Amigos & Influenciar Pessoas: O guia clássico e definitivo para relacionar-se com as pessoas. Tradução de Fernando Tude de Souza. 52. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2012.

CARON, Nara Amália. A Relação Pais-bebê: da observação à clínica. São Paulo: Casa do Psicólogo. (2000).

CHOPRA, Deepak et al. O Efeito Sombra: Encontre o poder escondido na sua verdade. Tradução de Alice Klesck. São Paulo: Lua de Papel, 2010.

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